sábado, 3 de maio de 2008

cartas

Será que ando mesmo tão nostálgica?
Ontem me deu uma saudade de escrever cartas. Cartas físicas. Não emails banais. Papéis, canetas, envelopes, aquele com as tirinhas verde-amarelo, que nunca me deixavam usar, pois só foram concebidos para correspondências internacionais, ou aqueles brancos com as demarcações em laranja, com os quadradinhos para o cep, e que, esses sim, eram usadas para correspondências nacionais? Os blocos de papéis para carta? Aqueles que pareciam papel seda, que eram leves para baratear o preço? Nunca mais os encontrei e sinto muita falta. Isso me remete à segunda gaveta da cômoda da minha avó. Ela, que tinha um familiar em cada canto do Brasil, era dessas adeptas da correspondência, e escrevia como poucas. Aos 80 e tantos anos, tinha a letra linda. Assinava o nome completo, para inveja das muitas recepcionistas-para-mim-estar-te-chamando.
Ana Maria Guimarães Cavalcanti
, e ela sempre fazia uma pose ao assinar, caprichava. Enfim, eu adorava as cartas dela. Sempre iam com uma folha, uma pétala de rosa, um pedaço de lã bonita, ou um tecido com estampas delicadas. Os papéis ficavam sempre juntos de uma colônia que ela tinha comprado em uma viagem ao Maranhão, era uma colônia azul que eu fazia questão de passar quando minha mãe me deixava tomar banho lá. Tinha cheiro de conforto, de casa da vovó, de comer mamão até o intestino soltar, de dormir tarde, de ler ao lado da máquina de costura, de lãs no meio do caminho, de gatos no colo, de doce de banana com farinha. As cartas de vovó tinham o cheiro dela. Cheiro de inteligência e gargalhada gostosa.
Eu sempre liguei o hábito de escrever cartas às pessoas inteligentes. Pessoas burras estavam sempre ocupadas demais para transferir ao papel o que acontecia ao redor. E eu me sinto emburrecendo cada vez que pego uma caneta e vejo minha letra definhando. Cada vez que eu escrevo um rascunho no papel e aprimoro no computador. Cada vez que gasto 2 minutos escrevendo um email ao invés de gastar 1 hora escrevendo uma carta. Cada vez que, qdo preciso ler uma carta, tenho que esperar o computador ligar, o Windows iniciar e Outlook abrir.

Substantivo Feminino presente apenas na Língua Portuguesa:
Saudade - sentimento mais ou menos melancólico de incompletude, ligado pela memória a situações de privação da presença de alguém ou de algo, de afastamento de um lugar ou de uma coisa, ou à ausência de certas experiências e determinados prazeres já vividos e considerados pela pessoa em causa como um bem desejável.

3 comentários:

Flávia disse...

Compartilho vossa nostalgia... saudade das cartas, tão cheias de tato e do tato. Da vida de verdade.
Mademoiselle Gauche

Rodrigo Rover disse...

Arrebatador! Dos melhores posts já lidos ever. E a minha letra não tá definhando, está em estado avançado de putrefação mesmo, haha...

Rodrigo Rover disse...

[INFORMATIVO] O Seleta de Prosa está de volta a programação normal.

PS: eu sei que a nostalgia é grande, mas se quiser usar o computador pra postar a gente agradece ;-D